![]() |
| deputado federal Guilherme Derrite (PP-SP) |
O deputado federal Guilherme Derrite (PP-SP), relator do projeto de lei antifacção, alterou o texto elaborado pelo governo Lula (PT) para incluir as organizações criminosas, como o Comando Vermelho e o Primeiro Comando da Capital (PCC), na Lei Antiterrorismo. O parecer foi protocolado na noite desta sexta-feira (7) e está pronto para votação.
A equiparação de faccionados a terroristas é defendida pela direita, principalmente, após a megaoperação policial no Rio de Janeiro contra o CV. Com a repercussão da ação no Rio, o governo acelerou o envio do PL antifacção ao Congresso. O projeto é visto como pauta prioritária pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e uma chance de vencer o protagonismo da direita na discussão da segurança pública nas eleições de 2026.
Por isso, a escolha do secretário de Segurança Pública de São Paulo, estado governado por Tarcísio de Freitas (Republicanos), representa uma derrota para o governo Lula, que rejeita classificar as facções como terroristas, temendo a possibilidade de intervenção dos Estados Unidos no Brasil, como ocorre na Venezuela. Derrite deixou temporariamente a secretaria para reassumir o posto de deputado na Câmara.
Enquanto a gestão petista tentou reforçar a Lei das Organizações Criminosas (Lei 12.850/2013) com uma nova "qualificação" da organização criminosa, Derrite propôs enquadrar os atos mais graves desses grupos na Lei Antiterrorismo (Lei 13.260/2016), considerado um arcabouço legal mais rígido. O relator trata a atuação das facções como uma ameaça à paz e à soberania, e não apenas como um crime associativo mais complexo.
Outro projeto semelhante, o PL 1.283/2025, também enquadra as organizações criminosas na Lei Antiterrorismo. No entanto, a análise do texto na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) foi adiada duas vezes na última semana após pressão do governo. A proposta é relatada pelo deputado Nikolas Ferreira (PL-MG), que pretendia abrir mão da relatoria em favor de Derrite.
O substitutivo manteve o foco na necessidade de modernizar a legislação, mas alterou drasticamente a estratégia jurídica e a severidade das sanções, adotando o que chamou de "legislação de guerra em tempos de paz".
O texto original institui a figura da “organização criminosa qualificada” dentro da Lei de Organizações Criminosas (Lei nº 12.850/2013). Esse crime seria tipificado quando a organização buscasse o controle de territórios ou atividades econômicas mediante uso de violência, coação, ameaça ou outro meio intimidatório.
O relator considerou essa opção "frágil" e tecnicamente inadequada. Derrite defendeu que atos de domínio territorial armado e intimidação coletiva, que desafiam a autoridade do Estado, são de natureza "eminentemente bélica e subversiva da ordem pública".
Assim, o substitutivo insere essas condutas no novo Artigo 2º-A da Lei Antiterrorismo (Lei nº 13.260/2016). Entre as condutas específicas equiparadas ao terrorismo, estão:
Utilizar violência ou grave ameaça para impor domínio sobre áreas geográficas, comunidades ou territórios.
Impedir, dificultar, obstruir ou criar embaraços à atuação das forças de segurança (inclusive mediante barricadas, bloqueios ou incêndios).
Sabotar, inutilizar ou interromper o funcionamento de serviços públicos essenciais, hospitais, escolas, portos, aeroportos ou instalações de energia e petróleo.
O PL antifacção prevê penas para o crime de “organização criminosa qualificada" de 8 a 15 anos de prisão. A pena para quem integra, promove ou financia facções passa a ser de 5 a 10 anos (hoje é de 3 a 8 anos). Para homicídios cometidos a mando de uma organização criminosa qualificada, a pena será de 12 a 30 anos de prisão.
No substitutivo, as condutas qualificadas na Lei Antiterrorismo, como usar violência para exercer domínio territorial ou obstruir forças de segurança, passam a ter pena de reclusão de 20 a 40 anos. Essa pena também valerá para homicídios qualificados executados a mando das facções.
A dosimetria é considerada uma referência para delitos que atentam contra o Estado e a segurança coletiva e é a mesma aplicada ao feminicídio. Além disso, Derrite removeu a possibilidade de redução de penas para integrantes de facções que sejam réus primários e não ocupassem a liderança da organização.
O texto original previa a possibilidade de redução de pena de 1/6 a 2/3 se o agente for primário, tiver bons antecedentes e não se dedicar à liderança, promoção ou financiamento da organização criminosa. O deputado apontou que esse dispositivo cria uma "organização criminosa privilegiada". Ele argumentou que a redução esvaziaria a eficácia punitiva, possibilitando que membros de facções cumprissem penas muito curtas.
Ambos os projetos preveem medidas para coibir o comando criminoso a partir dos presídios, como o monitoramento audiovisual de encontros no parlatório. No entanto, o substitutivo introduz restrições mais severas na execução da pena:
Isolamento de lideranças: o relatório determina que as pessoas condenadas ou custodiadas pela prática dos atos equiparados ao terrorismo (Art. 2º-A), que exerçam comando ou liderança, cumprirão obrigatoriamente a pena em uma penitenciária federal de segurança máxima;
Progressão de regime mais dura: para os crimes tipificados, o tempo necessário para a progressão de regime pode chegar a até 85% da pena;
Vedação de benefícios: condenados por crimes previstos no novo Art. 2º-A da Lei Antiterrorismo não podem receber anistia, graça, indulto e livramento condicional;
Auxílio-reclusão: é vedada a concessão do benefício de auxílio-reclusão aos dependentes do segurado que esteja cumprindo pena por crimes tipificados no Art. 2º-A.
Os dois textos apresentam regras para descapitalizar as organizações criminosas. O texto do governo prevê a alienação de bens perdidos em favor da União sob a competência do gestor de ativos do Ministério da Justiça e Segurança Pública.
O substitutivo detalha e centraliza as medidas na Lei Antiterrorismo (Art. 2º-B, 2º-D) e inclui expressamente o bloqueio de ativos digitais, criptoativos, cotas societárias e bens mantidos em jurisdições offshores.
O parecer de Derrite exige comunicação imediata e obrigatória a órgãos de controle financeiro, como o Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf), Banco Central do Brasil (Bacen) e Comissão de Valores Mobiliários (CVM). Também determina o confisco ampliado de bens incompatíveis com a renda declarada do condenado nos cinco anos anteriores ao crime, salvo prova de origem lícita.
O produto da alienação dos bens perdidos deve ser destinado ao Fundo Estadual ou Distrital de Segurança Pública ou, na ausência deste, à Secretaria de Segurança Pública do estado onde o delito foi investigado. Já os bens móveis e imóveis apreendidos poderão ser destinados para uso de órgãos de segurança pública até a alienação definitiva.
Derrite reconheceu que "muitos pontos trazidos na proposição original são de excelente contribuição ao nosso sistema de justiça criminal". Veja abaixo os principais pontos que seguem no substitutivo:
Regras para infiltração policial;
Acesso facilitado a dados durante a investigação;
Criação do banco de dados sobre facções, mas com o nome de "Banco Nacional de Organizações Criminosas, paramilitares ou milícias privadas";
Intervenção judicial em empresas;
Afastamento cautelar do cargo, do emprego ou da função de agente público envolvido, como medida necessária à investigação;
Suspensão de contratos públicos;
Monitoramento audiovisual no parlatório de encontros físicos ou virtuais entre presos vinculados a facções ou milícias e seus visitantes, mediante autorização judicial, se houver indícios de uso para fins criminosos.
Vedação ao monitoramento da comunicação entre advogado e cliente, exceto em casos de fundadas suspeitas de conluio criminoso, a critério do juiz, que deve comunicar a decisão à OAB;
Transferência excepcional de presos.
Motta defendeu a escolha do relator após críticas de intergrantes do govenro Lula. "Li o relatório do deputado Derrite, que preserva avanços do projeto do Governo Federal e endurece as penas contra o crime. O plenário é soberano e o debate será amplo, transparente e democrático", disse no X.
O governo federal descarta classificar facções como organizações terroristas, argumentando que a mudança pode abrir uma brecha para operações dos Estados Unidos no Brasil, como ocorre na Venezuela.
A ministra das Relações Institucionais, Gleisi Hoffmann, afirmou que a "opção pelo Secretário de Segurança do governador Tarcisio de Freitas contamina o debate com os objetivos eleitoreiros de seu campo politico". O líder do PT na Câmara, Lindbergh Farias (RJ), classificou a escolha como um "desrespeito" a Lula.
O governo enviou o PL antifacção ao Congresso após a megaoperação contra o Comando Vermelho no Rio de Janeiro. A ação terminou com 113 presos e 121 pessoas mortas, quatro delas eram policiais, e gerou uma troca de acusações entre o governador do estado, Cláudio Castro (PL), e o Executivo.
